Minha experiência com a Ayahuasca
Por:
Gustavo Cartaxo
Oi, a alguns
dias resolvi passar pela experiência de tomar uma droga! Uma substância, uma
bebida, na verdade é uma mistura de algumas plantas dissolvidas e cozidas em água
que possuem características, vamos dizer, psicodélicas. No Brasil existe uma
religião baseada em tomar essa bebida uma vez por semana e realizar certos
rituais, chama Santo Daime. Na Amazônia, onde ela foi descoberta por índios a
muito tempo, ainda existem Shamans que vendem a cerimônia para pessoas da
civilização. Como estou morando na Europa, o único lugar que eu poderia beber
essa substância seria na Holanda, e foi o que fiz.
Descobri um
site que oferece a bebida junto com uma cerimônia e resolvi me inscrever, eles
me enviaram um livro de 300 páginas para ler e eu li. Fiquei com a ideia na
cabeça de que a droga me permitiria viver os sentimentos que guardei durante
minha vida, colocar pra fora meus traumas, isso faria eu entrar em contato com
minha inner child, seria como se a sociedade sujasse meu espirito durante minha
vida, e a experiência pudesse limpar. Além disso, o livro disse, que a
substância me permitiria viver minha vida no meu full potential, e descobrir o
que eu deveria fazer de minha vida, e ainda tinham pessoas que ganhavam poderes
depois da cerimônia, como clarividência e premonição.
Vi vídeos de
pessoas tomando a Ayahuasca, experiências diferentes, mas uma coisa em comum,
passaram por momentos difíceis ou muito fortes durante a viagem, e preferem o
mundo que enxergam depois da droga.
Foi com essas
expectativas que cheguei no lugar, eu queria mudar algumas coisas na minha
vida, queria achar algumas respostas. As perguntas que fiz pra Mother
Ayahuasca, foram o que é vitalidade? Com isso, o que eu devo fazer de minha
vida? e o que é amor? Com isso porque eu não me envolvo em relacionamentos
sérios sabendo que não tenho dificuldade em atrair algumas mulheres?
Cheguei uma
noite antes, apenas eu e mais dois dos dezenove participantes chegaram uma
noite antes, resolvi fazer isso para conhecer melhor o local, para tirar todas
as dúvidas que o livro me deu e para extrair o máximo que podia das pessoas que
ali estavam. Conheci Cristian, da Roménia, 27 anos, primeira vez que saiu de
seu país, não gosta do emprego e acha que lhe falta vitalidade. E Martin, 37
anos, Sueco que mora em Londres, trabalha com vendas, também insatisfeito com o
trabalho e com o fato de achar que nunca amou na vida. Os guias que ali estavam
eram muito amorosos e calmos, estabeleciam um contato visual muito forte de
primeira, senti como se existisse uma conexão entre as almas quando havia o
contato visual. A primeira que conheci foi Eva, uma mulher de 40 anos, gostosa,
que me apresentou o local; um cara de 25 anos, forte, que parecia um leão e foi
ele quem fez a bebida; Geke, a dona do local, com quem eu tive uma conexão
muito boa, até por e-mail; Dennis, que tocaria durante a viagem; Yuka, um jovem
que foi guia pela primeira vez e estava ansioso para ir bem e contratarem ele;
e Irene, uma mulher de 50 e poucos anos muito calma e amorosa.
No dia
seguinte, conhecemos todos os participantes, todos eram pessoas muito
interessantes do mundo todo e de todas as idades acima de 23 anos. Apenas 4 já
tinham bebido a Ayahuasca antes, e todos estavam ansiosos para experimentar.
Tinha um casal de Liverpool; um casal de jovens que moravam na Alemanha, a
garota tinha uma relação muito forte com seus sonhos, as vezes sem saber
distinguir sonho de realidade; dois jovens rapazes que não acreditavam em nada
que o pessoal da cerimônia fazia, estavam pela experiência com a droga psicodélica;
não vou me alongar na explicação do local e das pessoas, pois apesar de ter
gostado muito delas, não é o interesse desse texto.
Na manhã
fizemos uma sessão pra nos conhecermos, depois tomamos sopa, depois fizemos uma
sessão de dança, o objetivo era esquecer do julgamento social, e deixar seu
espírito livre. Para mim, como para todos, foi muito difícil esquecer que eu
estou sendo julgado, principalmente porque eu danço bem. O que achei muito
interessante sobre a dança foi que fizemos exercícios de dança em dupla, e isso
era sobre a conexão, olhos fixos uns nos outros, sentindo os movimentos dos
corpos se alinharem, muito bonito. Uma dança mais sexual aconteceu também, foco
nos quadris, gostei muito de dançar com uma holandesa jovem e com Eva, os olhos
delas que não piscavam e que conectavam sua alma com a minha, mesmo que minha
alma só estivesse pensando em fazer sexo com ela. Ao fim, trocamos momentos de
compreensão individual com cada um, olhos nos olhos, uma mão cobrindo a outra,
foi muito bom para todos se sentirem bem com ambiente e com os outros, para se
prepararem para a Ayahuasca.
Depois de um
intervalo, fizemos a última coisa do dia, uma sessão de breathwork, se tratava
de respirar bem rápido durante 50 minutos, enquanto sons eram tocados. Logo no
inicio senti meus braços travados e encolhidos, fiquei com medo da experiência
e fiz pausas, em um determinado momento, comecei a senti vontade de chorar, e a
falta de ar que sentia quando me sentia angustiado quando era pequeno. Quando a
sessão estava no fim, eu me senti muito mal e pedi ajuda, guias vieram me
ajudar me dando conforto, agradeci muito a ajuda, mas fiquei sem entender
porque me senti mal. Essa experiência me fez sentir medo da Ayahuasca, pois me
senti mal, sem saber o porquê.
Conversamos durante
o final da noite, e nos preparamos para a manhã seguinte, na qual tomaríamos a
bebida logo pela manhã. Dormi na sala onde aconteceu todas as cerimônias e onde
aconteceria a cerimônia principal.
Todos
vestiam-se totalmente de branco, deitados em seus colchões, com bacias próprias
caso queiram vomitar, e vendas para os olhos, todos preparados, eu, cheio de
medo e ansiedade. Geke falou bastante, meditamos juntos, e me deram um copo da
bebida. Após o primeiro copo eu sentia ondas de menos medo ou mais medo, mas
não me senti nem um pouco mal, aceitei o segundo copo. Geke falou que
poderíamos tomar um terceiro copo, mas não era necessário, comecei a me
questionar se era pra mim, pois não estava entrando na viagem. Lembrava do
livro que dizia que era melhor entrar na viagem sem tentar entende-la, mas eu
sentia que minha mente ainda estava ali tentando entender tudo, pedi um
terceiro copo para que a Ayahuasca ganhasse de minha mente, e foi o que ela
fez!
Senti minha
alma querendo sair do corpo, mas a parte do peito era mais pesada e não saia.
Entendi então que havia algo errado com meu peito, visualizei meu chacra do
peito e resolvi abri-lo, como num desejo de liberar meus sentimentos guardados!
Não aconteceu nada, me senti normal, escutei pessoas gritando e chorando, tirei
a venda e observei onde estava, coloquei a venda nos olhos de novo. Comecei a
sentir coisas que não lembro ao certo, e por alguma razão resolvi tirar a venda
e vivenciar aquilo no mundo real não só na minha mente. Primeiramente me senti
me transformando em um animal, meu rosto virando o de um tigre, eu rastejando
feito uma serpente. Lembro que comecei a achar que eu era um Shaman, fiquei só
de cueca pois achava que as roupas eram representações da relação social, e eu
não precisaria daquilo sendo um Shaman ou animal. Visualizei minha vida como
sendo um ser forte que quer dominar e sentir o mundo, antes, eu enxergava minha
infância como uma criança fraca e com pena de mim, isso mudou. Senti o poder de
ser malvado também, nunca quis admitir mas nenhum ser humano é totalmente bom
ou totalmente mal, e eu senti como posso prejudicar os outros, senti veneno
saindo de minha boca, logo depois disso vomitei. Vomitei imaginando que eu
estou expelindo o resto do veneno, o veneno que corrói minhas relações com as
pessoas de que gosto, o veneno que corrói minha própria vida.
Depois disso,
estava empolgado em ser alguém que controla o universo, e quis testar isso,
quis sentir o poder. Em um dado momento tentei alcançar o céu, tentei ser maior
do que eu mesmo, estiquei meus braços em direção ao teto. Depois de alguns
segundos eu cansei. Mais tarde, eu percebi que isso era minha característica
egocêntrica e eu tive que entender meu espaço aqui na terra, minha pequenez.
Saindo disso
olhei para meu corpo e me senti insatisfeito. Batia em minha própria face
diversas vezes ao pensar em algo que não gosto em mim, percebi quanto sou duro
comigo mesmo e o mal que isso me faz.
Depois, senti
meu corpo ficando velho, perdendo energia, me senti morrendo, perdendo toda a
energia da vida, visualizei vermes nascendo de uma fruta podre, meu corpo se
contorcia. A experiência da morte foi horrível, e tenho certeza que nunca mais
vou cogitar a hipótese de suicídio pelo resto da minha vida. Essa experiência
só não foi a pior da viagem, porque a pior aconteceria em seguida.
Voltando da
morte, da completa falta de energia no corpo, eu imaginei sendo um velho que
não conhece ninguém, fechado, que ninguém ama, senti aos poucos a falta de
amor. Meus olhos viraram, e eu emitia um som de completa tristeza e sem
esperança nenhuma de retorno, imaginei que talvez eu precisasse de ajuda, mas
lembrei que o livro falava que devemos enfrentar o que aparecer o máximo que
conseguirmos. Lágrimas saíram de meus olhos, olhos que eu não conseguia abrir como
se eu estivesse totalmente imergido na falta de amor. Desisti de enfrentar
aquilo sozinho, levantei os braços pedindo socorro, sem conseguir gritar,
desesperado para sair daquela situação. Irene e Yuka vieram, dei um abraço
neles, senti o amor que eles me passaram! Foi o melhor abraço da minha vida!
Entendi, ou melhor, senti o que é o amor, senti que eu havia aprendido a viver
o mundo sozinho, e que a necessidade do amor vem de uma fragilidade, de uma
incompletude, fragilidade e incompletude que a criança forte aprendeu a
esconder, junto com parte dos seus sentimentos, e a partir desse dia, não
esconderia mais.
A partir daí,
minha viagem foi sentir os sentimentos e uma criança, me sentir como uma
criança de novo. Tentando satisfazer suas vontades, abraçar quem quiser, ir ao
banheiro quando quiser, beber água! Se comunicar, beijar Geke na boca! E a
transição entre essa criança de cueca e o mundo real foi acontecendo aos
poucos, quis trazer o máximo dessa criança pra minha vida!
Aos poucos
fomos uns aos outros contando nossas experiências e partilhando as coisas em
comum, todos estavam curiosos para entender os barulhos que eu havia feito, mas
esse texto é a primeira vez que tento explicar tudo de uma vez. Aos poucos nos
despedimos uns dos outros, abraços gostosos e sentimentos de saudades. Alguns
outros dormiram lá mais uma noite, como eu, e trocamos mais conversas.
Uma conversa
vale a pena ressaltar, algumas pessoas estavam falando de mudar de emprego e de
mudar de vida pra uma vida que gostam totalmente, eu achei isso infantil, as
vezes é necessário fazer aquilo que não gostamos, mas não falei com ninguém. Na
manhã seguinte, como se soubesse da minha angústia, o mais velho do grupo, que
parecia um pouco com meu pai me disse que achava aquele papo infantil também,
que todos devemos ter um lugar na sociedade e não fugir dela, que a sociedade
dá uma base forte e que trabalhar e fazer as coisas que devemos fazer e não
gostamos é um ensinamento muito forte. Que a vida é boa porque aceitamos a sociedade,
e que se todos só fizessem aquilo que gostam a sociedade não funcionaria.
Estava me
sentindo muito bem, todos estavam, mas eu quis mais, lembrava que no livro
diziam que se você fumasse maconha no dia seguinte os efeitos iriam voltar,
decidi fazer isso, sem o apoio do local e o amor dos guias, no meio de uma
cidade movimentada, no meio de Amsterdã!
Fomos Cristian,
o casal da Alemanha e eu para Amsterdã, e eu fumei, comi bolinho e fumei com
Cristian, comecei a pensar demais, a refletir sobre tudo que aconteceu, meu
cérebro ficou perto de fritar e eu fiquei com medo, com medo de ficar maluco.
Dormi uma noite em Amsterdã num albergue com Cristian, ele estava totalmente em
paz e me falava que eu pensava de mais, ele aceitava a vida e estava feliz. No
dia seguinte eu fui com ele até a estação de trem e fiquei sozinho, tinha medo
de ficar sozinho com meus pensamentos, falei com um amigo, Gabriel, que está
morando numa outra cidade na Holanda, acabei dormindo 3 noites aqui, vou dormir
mais uma, e amanhã já estou preparado para passar uma semana numa floresta na
Bélgica como havia planejado, antes de ir para o melhor festival de música
eletrônica do mundo, a Tomorrowland!
Eu realmente
pensei muita coisa e não vale a pena falar sobre elas, mas ao passar dos dias,
a medida que fui ganhando confiança na minha mente, comecei a sentir que ao
invés de pensar de mais estava sentindo de mais. O medo de ficar maluco estava
maior do que jamais senti na vida, quando eu iria pedir ajuda para alguém
afirmando que eu não conseguiria dormir sozinho? Quando eu teria tanto medo de
morrer como tenho agora? Ou medo de ficar sozinho? Aprendi que ter aberto meu
peito me deixou bem mais frágil. Agora eu tenho que aprender a viver com essas
coisas no peito, que a humanidade chama de sentimentos.
Das perguntas
que fiz para a planta, ainda não tenho certeza da resposta sobre o que devo
fazer da vida ou sobre o que é vitalidade, apesar de que senti muita energia e
vitalidade quando estava me sentindo uma criança. Essas perguntas levarei
comigo para refletir longe da sociedade, durante minha semana na floresta.
Amanhã de manhã
estarei partindo! Abraços!
11/07/2014
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